Obesidade e pressão alta em crianças e adolescentes

A obesidade infantil é um problema crescente no Brasil e em todo o mundo, com consequências alarmantes para a saúde das crianças e adolescentes. Uma das complicações mais preocupantes dessa condição é o aumento da prevalência de hipertensão, que pode ter efeitos adversos na saúde ao longo da vida. Neste artigo, exploraremos as estatísticas brasileiras e internacionais, bem como possíveis soluções para esse desafio de saúde pública.

Os registros do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) apontam que uma em cada três crianças, com idade entre cinco e nove anos, está acima do peso no País. As notificações do Sistema de Vigilância Alimentar e Nutricional, de 2019, revelam que 16,33% das crianças brasileiras entre cinco e dez anos estão com sobrepeso, 9,38% com obesidade, e 5,22% com obesidade grave. Em relação aos adolescentes, 18% apresentam sobrepeso, 9,53% são obesos e 3,98% têm obesidade grave.

No cenário internacional, as taxas de sobrepeso e obesidade nesta faixa etária aumentaram em todo o mundo, de menos de 1% (equivalente a cinco milhões de meninas e seis milhões de meninos) em 1975, para quase 6% em meninas (50 milhões) e quase 8% em meninos (74 milhões) em 2016. O número cresceu mais de dez vezes. De 11 milhões em 1975 para 124 milhões em 2016.

Os dados sobre a obesidade infantil são tão alarmantes, que a Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que em 2025 o número de crianças obesas no planeta chegue a 75 milhões.  Estudos apontam que a prevalência de hipertensão nessa faixa etária aumentou em paralelo à obesidade, tornando-se um problema de saúde pública global.

A obesidade é um fator de risco conhecido para o desenvolvimento de hipertensão em crianças e adolescentes. O excesso de peso pode aumentar a resistência dos vasos sanguíneos e afetar a função dos rins, levando a um aumento na pressão arterial. Além disso, a obesidade também está relacionada a outros fatores de risco para hipertensão, como resistência à insulina e síndrome metabólica.

Um dos principais contribuintes para a hipertensão neste grupo é a ingestão excessiva de sódio na dieta. Muitos dos alimentos processados e ultraprocessados consumidos pelos jovens hoje em dia contêm altos níveis de sódio, que podem aumentar a pressão arterial. O sódio em excesso faz com que o corpo retenha mais líquidos, aumentando o volume sanguíneo e, consequentemente, a pressão sobre as paredes das artérias. Reduzir o consumo de alimentos ricos em sódio, como salgadinhos, embutidos e refeições prontas, e incentivar a ingestão de alimentos naturais e frescos pode ajudar a prevenir a hipertensão relacionada à dieta nessa faixa etária.

A crescente popularidade de videogames, computadores e redes sociais também tem um papel importante no aumento da obesidade entre crianças e adolescentes. O tempo gasto em frente às telas, seja jogando videogames, navegando na internet ou interagindo nas redes sociais, muitas vezes substitui atividades físicas e contribui para o sedentarismo. Além disso, o uso excessivo de dispositivos eletrônicos pode levar a padrões de sono inadequados e alimentação desregrada, que são fatores de risco adicionais para a obesidade. Para combater esse problema, é fundamental promover um equilíbrio saudável entre o tempo de tela e a atividade física, além de incentivar hábitos de vida saudáveis, como uma alimentação equilibrada e um sono adequado.

As questões relativas a  saúde mental, como depressão, estresse e ansiedade, também desempenham um papel importante no aumento da obesidade e da hipertensão em crianças e adolescentes. O estresse e a ansiedade podem levar a comportamentos alimentares emocionais, nos quais os jovens buscam conforto em alimentos altamente calóricos e pouco saudáveis, contribuindo para o ganho de peso. Além disso, o estresse crônico está associado a alterações hormonais que podem afetar o metabolismo e a pressão arterial. Para enfrentar esses desafios, é essencial promover a saúde mental e o bem-estar emocional dos jovens, fornecendo acesso a recursos de apoio, como aconselhamento e terapia, e incentivando a comunicação aberta e o desenvolvimento de habilidades de enfrentamento saudáveis. Isso pode ajudar a prevenir a obesidade e a hipertensão relacionadas ao estresse e ansiedade, contribuindo para uma vida mais saudável e equilibrada.

Um estudo recente, divulgado na última edição da ABC Cardiol, revista da Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC), procura descrever a incidência de hipertensão e sua relação com o perfil cardiometabólico e genético em crianças e adolescentes.

A análise, publicada no artigo “Incidência de Hipertensão Arterial está Associada com Adiposidade em Crianças e Adolescentes“, foi realizada com dados do município de Santa Cruz do Sul, no estado do Rio Grande do Sul, ao longo de três anos.

Esta pesquisa faz parte de um projeto maior, chamado Saúde dos Escolares, que avalia crianças, adolescentes e jovens adultos da cidade e região. Um primeiro artigo produzido e já publicado, parte de uma dissertação de mestrado, comparou fatores de risco cardiometabólicos de crianças e adolescentes brasileiros com valores de referência internacionais.

A partir desse ponto, a pesquisa aprofundou-se na questão da incidência de hipertensão em crianças e adolescentes e sua relação com outros fatores de risco.

“Existem poucos estudos que tratam deste tema, principalmente estudos longitudinais, de coorte, que acompanham os mesmos indivíduos ao longo do tempo.”, explica Leticia Welser, formada em Educação Física, mestre e doutoranda em Promoção da Saúde e principal autora do artigo.

Ela destaca que estudos que investigam a incidência de hipertensão e sua relação com outras variáveis cardiometabólicas, incluindo informações do perfil genético, em crianças e adolescentes, são ainda mais raros.

Comparado com estudos anteriores, verificou-se um aumento na incidência de hipertensão em crianças e adolescentes, mais especificamente de 11,5%.

“Indivíduos com valores mais altos de Índice de Massa Corporal (IMC), Circunferência da Cintura (CC) e Percentual de Gordura (%GC) no baseline (coleta inicial) apresentaram maior probabilidade de desenvolverem hipertensão após 3 anos, sugerindo a importância da adiposidade neste processo, mesmo em uma população tão jovem”, afirma Leticia.

A aplicação prática dos resultados do estudo envolve a prevenção, que deve ser realizada desde a infância. Leticia enfatiza a importância de um rastreamento regular para hipertensão, aliado a ações de promoção à saúde, como orientações para um estilo de vida saudável e prevenção de fatores de risco.

“Além disso, são necessárias iniciativas de estudos de intervenção para que, desta forma, consigamos mudar o futuro da saúde desta população”, conclui ela.

Para enfrentar o problema da obesidade e hipertensão em crianças e adolescentes, são necessárias ações coordenadas em várias frentes:

  1. Educação alimentar: Investir na educação nutricional de crianças, adolescentes e suas famílias é crucial para a promoção de hábitos alimentares saudáveis e a prevenção da obesidade.
  2. Promoção da atividade física: Estimular a prática regular de atividades físicas, tanto no ambiente escolar quanto fora dele, pode ajudar a combater o sedentarismo e reduzir o risco de obesidade e hipertensão.
  3. Políticas públicas: Implementar políticas públicas que incentivem a alimentação saudável, como a regulação da publicidade de alimentos ultraprocessados voltada para crianças e a promoção de alimentos frescos e naturais, pode auxiliar no controle da obesidade infantil.
  4. Acesso à saúde: Garantir o acesso a serviços de saúde de qualidade, incluindo acompanhamento nutricional e monitoramento da pressão arterial, é fundamental para a prevenção e tratamento da obesidade e hipertensão.

Em resumo, a  obesidade e a hipertensão em crianças e adolescentes são problemas crescentes no Brasil e em todo o mundo, com implicações significativas para a saúde futura dessa população. Para enfrentar esses desafios, é essencial adotar estratégias multidisciplinares que envolvam educação, promoção da atividade física, políticas públicas e acesso à saúde.

Ao trabalharmos juntos para combater a obesidade e a hipertensão entre crianças e adolescentes, podemos ajudar a garantir uma vida mais saudável e feliz para as gerações futuras.

Aqui estão algumas referências de artigos e livros que podem ser úteis para os leitores interessados em aprofundar seu conhecimento sobre a relação entre obesidade, hipertensão e fatores relacionados em crianças e adolescentes:

  1. Artigos:
  • Bloch, K. V., Klein, C. H., Szklo, M., Kuschnir, M. C. C., Abreu, G. A., Barufaldi, L. A., … & Borges, A. L. V. (2016). ERICA: prevalências de hipertensão arterial e obesidade em adolescentes brasileiros. Revista de Saúde Pública, 50(supl 1), 9s. https://doi.org/10.1590/S01518-8787.2016050006685
  • Vitorino, P. V. O., Padrões alimentares e fatores associados em crianças e adolescentes de escolas públicas do município de Colombo, Paraná, Brasil. Dissertação de mestrado, Universidade Federal do Paraná. http://hdl.handle.net/1884/43627
  1. Livros:
  • Costa, R. F., Cintra, I. P., Fisberg, M. (2007). Obesidade na Infância e Adolescência – Uma verdadeira epidemia. Editora Atheneu. ISBN: 9788538800570
  • Sarni, R. S., & Catherino, P. (2012). Obesidade Infantil: Da prevenção ao tratamento. Editora Manole. ISBN: 9788520427557

Dr. Jaide Murilo F.  Silva ,Cardiologista – CARDION